Bailandesa

Abre-te Sésamo

Ela entrava todo dia na sala, encolhida no seu véu, trocava o saco plástico das lixeiras e não abria nem um sorrisinho. Eu agradecia em inglês – língua oficial do escritório – e ela quase que soltava um gemido incompreensível, saía da sala e a loucura do dia-a-dia fazia com que eu a esquecesse. Foram semanas assim.
Toda as manhãs a minha lixeira ficava vazia e a minha cabeça cheia de pressuposições. Primeiro achei que era mau humor e depois pensei em timidez. Não pensei da barreira da língua porque o sorriso é uma língua universal e se tem uma coisa me incomoda é gente que não sorri ou que não devolve um sorriso. Não me dá raiva não, apenas não entendo e fico matutando, tentando entender o comportamento.

Ontem quando ela entrou, decidi: “‘É hoje!”. Se não vai sorrir, vai pelo menos falar. Vou encostar na parede, cachoalhar essa criatura, colocar de cabeça pra baixo, fazer cócegas, torturar, fazer qualquer coisa, mas isso não vai ficar assim.

Em milésimos de segundo, tracei a estratégia e soltei um alto e sonoro: Goeiemorgen! – bom dia em holandês. Gente, incrível! Enquanto a palavra ia se formando no ar, a senhora ia abrindo um sorriso maior do que o de Tião Macalé e perguntou aliviada: você fala holandês?!. Expliquei que o meu holandês era importado diretamente do Paraguai, mas que me virava e que entendia quase tudo. Me senti um Moiséis abrindo um caminho no Mar Vermelho, ou quem sabe uma Ali Babá roubando sorrisos. Sei que a prosa engrenou e descobri que ela é da Turquia, que mora aqui há 6 anos e é casada com um holandês. Ela falou um pouco do seu país, eu do meu e depois voltamos ao trabalho. Ela aliviada por encontrar alguém que fala a língua e eu por não ter mais que conviver com o meu matinal e breve incômodo diário.

beijo e muitos sorrisos pra vocês.

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