Bailandesa

Copa do Mundo e o coração imigrante

Às vezes a gente tem que experimentar um pouco do já conhecido pra se (re)descobrir

Até dois jogos passados estava completamente desligada da Copa. Sabia que estava perto, mas sentia muito longe. Ouvia os comentários, lia manchetes e nem de longe batia o entusiasmo.
Não pude assistir o primeiro jogo porque tinha que estar presente na aula de holandês. Fiquei desolada quando me toquei da coincidência dos horários, mas fui pra aula e lá me desliguei de novo do evento.
No segundo jogo do Brasil, fui assistir em um café em Utrecht e aí a mágica do reencontro aconteceu. Cheguei meio desconfiada, sentei num cantinho e comecei a assisitir o jogo.
– Juiz ladrão!
– Tira Fulano! Bota Sicrano!
Os comentários, como fogos de artfícios, pipocavam entre as camisas verde e amarelas. Gestos bruscos, mãos em prece, mãos no rosto, na boca, gritos. Paixão no ar! Comentários irônicos, sarcásticos, alguns machistas, é bem verdade, mas quase todos apaixonados. Diante do espanto dos holandeses que trabalhavam no bar, um grupo de pessoas entregava por 90 minutos toda a sua emoção.
Eu, que no início, sentava quieta num cantinho, me peguei reclamando, empurrando os jogadores, torcendo, fazendo piadas. Na verdade, quem lá sentava era a menina que, nos domingos, acompanhada do pai e das irmãs, ia assistir os jogos na Fonte Nova em Salvador. De camisa rubro-negra gritava, xingava, apostava e torcia entre uma pipoca, um rolete de cana ou um amendoim cozido.
Na pausa, um sambão rolando no fundo. Um comichão bate num pé, que chama o outro pra dançar e acende uma centelha que percorre o corpo. Aí, de repente me toco: – Epa! Ainda gosto disso. Adoro os festivais de jazz, amo diversos estilos de música, mas ainda gosto muito disso.
A vida de expatriada lhe traz novas experiências, conhecimentos, emoções e habilidades, mas também corta muitos laços. Assim, vivemos em ondas de proximidade e distanciamento da terra e cultura natais. Devo dizer: a Copa do Mundo, mais do que alegrias no esporte, tem me dado a oportunidade de reviver emoções e memórias que dormiam em um cantinho qualquer no meu coração de imigrante. Vamos torcer que o Brasil siga vencendo e eu me reencontrando.

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