Bailandesa

O dia em que tive medo de avião

Voltava do Rio de Janeiro, umas das cidades no mundo chamo de minha. Estava de férias, feliz e relaxada. Seriam apenas aproximadamente 1:50 minutos de voo, num percurso que já tinha feito tantas vezes em minha vida que, se não fosse pelo ar, conheceria cada pedrinha do caminho.
Aeroporto - Rio de Janeiro
Voo tranquilo, céu de brigadeiro e muita disposição para aproveitar as últimas duas semanas na Boa Terra. Nunca tive medo de aviao. Parece que nasci pra andar naquele tubo metálico de rabo e asas que rasga os céus sem parcimônia e faz esse mundo ficar menorzinho.

A comissária jogou uns amendoinzinhos na mesinha, enquanto não desgrudava do meu livro. Conversava de vez em quando com (na)marido. Comentávamos como tinham sido especiais os últimos dias no Rio e como as férias em geral pareciam perfeitas. Lá embaixo, já via as luzinhas soteropolitanas piscando pra nós e o mar nos dando as boas vindas. Enquanto brincávamos de adivinhar os lugares da cidade lá do alto, o avião seguia seu curso em velocidade de cruzeiro.

Sentados na segunda fila, esperávamos o momento do pouso. Já sentia o gostinho do acarajé e o cheiro de Salvador. Sim, para mim cada cidade tem um cheiro próprio. Faz parte da identidade de cada local.

O Pouso

Trens de pouso a postos. De repente um enorme estrondo e uma pancada muito forte. Cheguei a duvidar se os trens de pouso realmente tinham descido. O avião dá uma sambadinha, toca de novo o chão com força e arremete. Me senti num lançamento de foguete. O avião fazia um esforço tremendo para voltar para os céus. E eu pensava:  É agora que eu vou pro céu?

Silêncio total. No avião e entre nós. Eu e o (na)marido de mãos dadas, nos olhávamos e não falávamos nada. Enquanto o filminho da minha vida começava a passar na cabeça. A minha mão gelada e suada apertava a dele. As nossas mãos  estavam apoiadas no joelho dele que tremia nervosamente.

Será que vai ser agora?

Em filmes de desastres de avião, vemos pânico, despedidas românticas e desesperadas. No nosso caso, nada. O silêncio sepulcral só foi interrompido, pela senhora sentada à frente que desesperadamente queria saber se o avião tinha levantado voo novamente. Expliquei que sim e que ela deveria manter a sua poltrona em posição vertical. Apenas nos olhávamos. Tinha a impressão que os nossos olhos emitiam sons:  será que vai ser agora? mas ainda há tanta coisa pra fazer, pra ver?

Quase hein!

O piloto finalmente resolve dá um esclarecimento e diz que devido a um pouso desestabilizado tiveram que arremeter. O avião sobrevou Salvador novamente. Dessa vez, as luzes não me pareciam tão acolhedoras.  Na segunda tentativa, muita expectativa, mas o avião conseguiu pousar. Detalhe: o comandante sai apressadamente da cabine e fala, não sei se pra nós ou  pra tripulação: – Quase, hein?!
Todos saíram do avião e não tivemos mais explicações. Mas fiquei com um gosto ruim na boca que trago até hoje. A tão longínqua e improvável possibilidade de um acidente de avião chegou mais perto de mim. Não que tenha desenvolvido uma fobia ou que isso atrapalhará as minhas viagens. Mas minha vida de passageira mudou. Jamais estarei relaxada como antes num pouso.  Hoje já posso dizer: tive medo de avião um dia.

Dias depois…..

Depois de termos chegado na Holanda e colocado as coisas em ordem, recebo um email de alguém, que via outra pessoa que conhecia alguém que trabalhava na mesma companhia aérea, soube de mais detalhes do quase acidente. Segundo essa versão, a copilota cometeu um erro na manobra, o avião bateu com a cauda no chão e o comandante teve que intervir com urgência. A copilota foi suspensa e o avião voltou para São Paulo para revisão. Ou seja, o comandante tinha razão: foi quase mesmo.

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