Bailandesa

A grávida e o xereta – uma crônica do cotidiano holandês

Gravidez na Holanda tem um caráter muito mais reservado do que no Brasil. Não é comum perguntar o sexo e o nome do rebento. Para alguns, é segredo de estado e só é divulgado após o nascimento. No último final de semana, me deparei com uma cena que me lembrou esse costume holandês.

A grávida e o xereta

– É menino ou menina?

Ouço a pergunta num dos lugares mais inusitados: num bicicletário. O sorridente rapaz que lá trabalhava disparou a pergunta, nem dando  tempo para a jovem grávida que chegava na minha frente pensar.

Diante de todo o mistério que envolve o assunto da gravidez na Holanda, achei engraçada e fiquei totalmente surpresa com a naturalidade com que o rapaz fez a pergunta. A futura mamãe, desconcertada, até que reagiu com bom humor. Deu uma risadinha e disse um “não sei, não sei”, meio que já de passagem. O rapaz não se deu por vencido e retrucou na hora:

– Da próxima vez quero saber hein?!

Imagem: Simply bike ( Flickr)
 

Grávida à vista. Cuidado redobrado.

Saí para fazer compras, com a história na cabeça e pensando em como me surpreendi com a situação.  Senti como isso já fizesse parte da minha própria cultura. Também notei que nunca ajo naturalmente diante de uma grávida holandesa. Sempre procuro controlar o impulso brazuca de encher a barrigudinha de perguntas e quem sabe dar aquela passadinha de mão básica. Sei, às vezes é até um comportamento reflexo, uma maneira de se mostrar interessada. Quando a pessoa está grávida, é quase uma obrigação se mostrar totalmente interessada. Mas aqui, sabe que ainda fico meio sem jeito. No meio do caminho: como mostrar interesse sem parecer xereta?

Sem incentivar dilemas, aconselho ao recém-chegado que tente agir com naturalidade, mas saiba que uma mulher grávida na Holanda pode ser um campo minado para desentendimentos multiculturais.

Agora o relógio

Voltei das compras e, ao entregar o papelzinho de controle ao mesmo rapaz, ele olha para a sacolinha que estava na cesta da minha bicicleta e fala com uma certeza que só os mais inxeridos ousariam ter:

– Comprou um relógio, não foi?

Confirmo, com um misto de susto e indignação. Ele sorri e fala:

– Eu sei, conheço a caixa!

Saí meio resmungando, com uma sensação de privacidade invadida e me perguntando quão holandesa já me tornei.

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