Me perguntaram se já fui vítima de preconceito na Holanda. Fiz uma revisão dos meus anos de bailandesa e não é que encontrei pelo menos três exemplos.
A Holanda é conhecida pela diversidade e tolerância, mas será que isso impede o preconceito? (c) priscilla du preez – unsplash
Preconceito x Discriminação
Antes de passarmos para as minhas experiências, é importante diferenciar preconceito de discriminação racial.
- Preconceito é quando formamos uma opinião sem qualquer base ou conhecimento dos fatos.
- Discriminação racial é quando alguém é prejudicado de alguma forma por sua origem étnica.
Minhas experiência com preconceito e discriminação na Holanda
Preconceito na porta de casa
Ela me olhou dos pés à cabeça e perguntou:
– Você mora aqui?
Atrás de mim, dois pacotes com o endereço da casa em frente.É que eu tinha esquecido de entregar uma encomenda deixada pelo carteiro.Após alguns segundos de hesitação, caiu a ficha de que ela não me via como alguém podia morar naquela casa. Passado o susto, respondi com um tom assertivo:
– Sim, acabei de comprar.
Claro que eu tinha acabado de me mudar e, em dia de faxina, não estava parecendo uma princesa da Disney. Mas isso faria com que ela duvidasse que eu poderia morar naquele local? Foi preconceito? Sim. No sentido em que, sem me conhecer, ela assumiu que eu não poderia comprar a casa. Ela teve intenção de me discriminar? Acho que não. A questão aqui não é a intenção, mas o fato em si. Na cabeça dela, não cabia o fato de eu poder ser a proprietária da casa. Na cabeça dela, eu estava limpando a casa de alguém.
Revendo o meu passado de preconceito na Holanda
Depois disso, resolvi dar uma olhada no meu passado holandês e rever situações em que fui vítima de preconceito racial na Holanda. E não é que encontrei diversos momentos em que senti na minha pele moreninha os efeitos de ser diferente ou não ser uma autêntica holandesa.
No mercado de trabalho, a discriminaçnao racial ainda é bastabte presente(c) christina-wocintechchat – unsplash
Mercado de Trabalho
Essa era uma das minha primeiras entrevistas de trabalho. Lá estava eu, um pouco nervosa, mas confiante. Enquanto respondia perguntas que deveriam ser relacionadas com a minha capacidade de exercer bem a função, me deparei também com: “Como você veio para a Holanda?”, “Pretende ficar?” e a melhor de todas, que guardo com carinho na minha coleção : “Você é uma pessoa do tipo ‘mañana’?”; uma nada sutil insinuação que sugeria que a minha origem sulamericana me tornaria numa procrastinadora.
Respondi com outra pergunta; “Se fosse holandesa, você me faria essa pergunta”. Ele ficou desconcertado e eu sem a vaga.
Discriminação no aeroporto
Nunca fui parada em nenhum aeroporto. No ano passado, voltando do Brasil sozinha de uma viagem de trabalho, tive as malas revistadas. Logo depois de pegar as minhas malas na esteira, um homem me pediu que o acompanhasse. Fez algumas perguntas, revistou a minha bagagem de mão e passou a minha mala no raio X. Notei que ele não ficou muito entusiasmado com a minha dupla nacionalidade. Do meu lado me senti incomodada com o fato de ter sido revistada, de passar por alguém suspeita. O detalhe perverso da história é que em todas as vezes que voltei do Brasil com acompanhada nunca tive nenhum problema. Dessa vez, me encaixei num determinado perfil: mulher, desacompanhada, vindo do Brasil e com uma aparência latina.
O holandês é preconceituoso?
O holandês se considera um povo tolerante e aberto a novas culturas. Ou seja o holandês não gosta se ver como preconceituoso, mas a realidade é diferente da imagem que eles têm de si mesmos. Os avanços em assuntos como o Zwarte Piet, acesso ao mercado de trabalho para jovens de origem de outras etnias tem caminhado a passos lentos. Também, comportamentos antes inaceitáveis na cultura da Holanda, tornam-se cada vez mais frequentes.
Julgue menos rápido
Ao relembrar momentos como esse, me surpreendo ao sentir que o preconceito está muito mais perto do que imagino. Nesses instantes você se toca como é ser diferente. O que é não fazer parte do grupo e entende que diferença incomoda. Muitos lutam diariamente para provar que devemos ultrapassar a fronteira o preconceito e além de imagens pré-criadas pela mídia, pela história, que são perpetuamente repetidas.
A minha lição dessas situações é:
se não pode deixar de julgar, pelo menos julgue menos rápido.
E você já vítima de preconceito aqui ou em qualquer outro lugar? Conte sua história pra gente.