Bailandesa

Entrevista: Ceumar, uma mineira em Amsterdam

Ceumar
Chego atrasada e ela abre as portas e um imenso sorriso. A mineira que morou em São Paulo e há pouco mais de um ano se mudou pra Amsterdã, me recebe com um inesperado e caloroso abraço e um fumegante café.
Sob uma bela luz de outono, na sua simpática cozinha, batemos um longo papo sobre música (óbvio), mas também sobre a a adaptação num novo país e as descobertas de uma artista que, independente de onde esteja, carrega uma musicalidade do tamanho do Brasil.
A primeira voz
A primeira vez que vi Ceumar senti uma overdose de brasilidade. E sem saber nada sobre ela, assumi e presumi que ela, como eu, carregava uma alma nordestina. Daí viria a levada percussiva do seu violão e a genuína pureza das suas canções. Na verdade mineira, ela me explicou que  a música sempre esteve presente na sua vida, seja pelo instrumento, herança do pai ou pela voz, presente materno.

“Comecei a tocar violão com o pai, mas o desvendar da voz se deu através da voz minha mãe. Afinadíssima estava sempre cantando pela casa..”  Sua referência maior foi cantada no Cd “ Meu Nome”, na faixa Mãe ( video abaixo)


Além da voz e do violão, a percussão já estava presente na infância de Ceumar. Ela não se divide quando o assunto é voz ou instrumento. Explica:

“O violão clássico me deu a base, mas sempre adorei percussão. Tinha um pandeirinho quando pequena e vivia tocando. Eu gosto de tocar. Eu adoro as duas coisas. Tocar um instrumento pra mim é também uma forma de comunicação. Não só a voz. Tenho cavaquinho, viola e recentemente ganhei um baixo. Adoro brincar e não ter medo de tocar, de arriscar.

A Holanda e a sua música

A crítica holandesa acolheu Ceumar com entusiasmo. Após o show de lançamento do seu quinto cd, Ceumar e trio – live in Amsterdam, várias resenhas positivas foram publicadas. Ela inovou, arriscou e o Mike Del Ferro Trio emprestou a sofisticação do jazz à singeleza das suas composições. Ela explica o porquê do sucesso:

“Por natureza, eu gosto de arriscar. Não posso ficar no mesmo lugar, sem me arriscar. Não é bom artisticamente, não é da minha natureza.”

A crítica já a acolheu.  E a história se repete com a reação do público holandês. Ceumar parece ter poderes de encantamento sobre a platéia batava. Ela fala da audência holandesa com um afetividade expressa no olhar:

“ Sinto um olhar de carinho. Claro que existe a formalidade, a dificuldade em relaxar. Mas a partir da terceira música, eles já relaxam e entram na atmosfera da música. Eles relaxam comigo.”

Mudança para a Holanda e a adaptação
O  primeiro encontro com o Mike Del Ferro se deu no Brasil e segundo Ceumar, rendeu um momento mágico, quando tocaram Dindinha pela primeira vez de improviso. Assim, a ponte foi construída e logo, logo Ceumar veio para uma turnê de sete shows na Holanda, através da Plataforma Brasil Holanda.
Nessas indas e vindas, assim como muitas outras brasileiras – incluindo a que vos digita – Ceumar encontra o amor na Holanda. E aí acontece a decisão da mudança. Pergunto a Ceumar como tem sido a adaptação. Então vemos que a afinadíssima cantora traça os conhecidos caminhos da saudade, comuns a quem deixou a sua terra natal, mas tira de letra o frio.

 “Tem pouco mais de um ano que cheguei e estou numa fase muito prática: filho na escola, a casa para cuidar e coisas normais do dia-a-dia. Sinto um pouco a mudança no corpo, principalmente na pele.  E claro que há uma nova dinâmica, a coisa do tempo, o frio, comida. Mas a verdade é que gosto de tudo. Até mesmo o frio tiro de letra. Venho do sul de Minas e lá é montanha. Então já viu, estou acostumada com o frio. O mais difícil é a coisa humana, A saudade das pessoas.”


 
Dindinha – Ceumar, Mike del Ferro,Olaf Keus, Pablo Nahar no Brasil
Fazer música na Holanda
A música brasileira tem o reconhecimento mundial e a Holanda carrega a tradição do jazz e de bons instrumentistas. Talvez por essa razão seja tão aberta para outros tipos de sons e ritmos. Para Ceumar, a Holanda é  uma verdadeira rota musical.

“A Holanda é passagem para muitos outros países. Tem essa coisa geográfica, é uma importante conexão dentro da Europa. Também tem um sistema de subsídios e muito mais estrutura para a cultural e inclusive para trazer músicos de outros países. Daí a força de tantos festivais importantes. Eles valorizam grandes músicos e instrumentistas. Por aqui já passaram e sempre passam músicos como Hamilton de Holanda, Yamandu Costa ou a talentosa Spok Frevo Orquestra. Agora eles precisam descobrir as cantoras”

E será que a Holanda, com uma paisagem e cultura tão diferente das suas origens  a tem inspirado ?

“A Holanda tem inspirado sim,  mas ainda está muito profundo. Ainda é cedo para aflorar”

Aventura musical
Com a mesma naturalidade com que absorve as mudanças e encontra o seu lugar num país distante, Ceumar faz música.  O seu album “ Meu nome”, quase se chamou “Pura”.  Talvez por ser sua música despida de complicações desnecessárias, sem muitas camadas de produção. Assim ela define a sua música

“Para mim é uma aventura poder ter essa atividade musical. Dede cedo comecei essa clareza: o que a minha música provoca nas pessoas? E comecei a obter respostas. As pessoas me falam, me escrevem o  que sentem ao ouvir a minha música. E o melhor é saber que a opinião delas vai além da música em si. Elas me revelam o que a música mudou na vida delas. Achei que podia fazer isso em qualquer  lugar do mundo. Aqui é um pouco diferente. Estamos caminhando, mas não quero ficar restrita à Holanda, quero tocar e conhecer os outros palcos, outras pessoas, outos mundos.”

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